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Depois do TSE barrar candidatura de Lula, coligação tem 10 dias para confirmar nomes da nova chapa

Em campanha em Aracaju, Sergipe, no último dia 22 de agosto, Manuela D’Ávila e Fernando Haddad (PT), devem ser anunciados como novos candidatos, respectivamente, a vice e a presidente, em nova chapa da coligação

Em sessão que durou mais de 10 horas, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) acolheu, em julgamento que terminou na madrugada deste sábado, 1 de setembro, o pedido do Ministério Público Eleitoral (MPE) para negar o registro de candidatura do ex-presidente Lula (PT), que tenta voltar ao cargo nas eleições gerais deste ano.

Segundo o Ministério Público Federal (MPF) os ministros do TSE entenderam que o candidato está inelegível, já que foi condenado criminalmente em segunda instância e está preso na Polícia Federal de Curitiba, no Paraná, desde abril.

O órgão lembrou ainda que a Lei da Ficha Limpa determina que sejam declarados inelegíveis os condenados por órgão judicial colegiado, e que a inelegibilidade conta a partir da decisão, até o transcurso de 8 anos após o cumprimento da pena.

Com a decisão, Lula também ficará impedido de praticar atos de campanha, incluindo a propaganda de rádio e televisão que, no caso da disputa presidencial, começou justamente no sábado, além de não poder ter seu nome incluído na urna eletrônica.

O TSE deu à coligação o prazo de 10 dias para substituir o candidato ao cargo de presidente. Com isso, a chapa deve apresentar o ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), como candidato à presidência, e a deputada estadual do Rio Grande do Sul, Manuela D’Ávila (PCdoB), como sua vice.

Manuela D'Ávila (PCdoB) e Fernando Haddad (PT) devem formar nova chapa da coligação entre PT, PCdoB e PROS. (Foto: Reprodução).

“No julgamento, prevaleceu o voto do relator do caso, ministro Luís Roberto Barroso, que seguiu os argumentos apresentados pela procuradora-geral eleitoral, Raquel Dodge, que havia ressaltado que cabe ao TSE aplicar os critérios previstos na Lei da Ficha Limpa e não rever a decisão condenatória da Justiça Federal”, contou o MPF.

Em seu extenso voto, o ministro Barroso fez um histórico da Lei da Ficha Limpa, ressaltando sua importância para a vida política do país e o fato de sua constitucionalidade ter sido confirmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

“Trata-se de uma norma originada de projeto de lei de iniciativa popular que contou com mais de 1,5 milhão de assinaturas e foi aprovada por votação expressiva pelo Congresso Nacional. Uma lei que tem lastro expresso no Artigo 14, parágrafo 9º, da Constituição, que impõe a proteção da moralidade como valor para o exercício do mandato eletivo, levando-se em conta a vida pregressa do candidato”, assinalou o relator.

A Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE) reforçou ainda que o período para pedidos de registro de candidatura não poderia sobrepor ou decisão judicial, no caso, da condenação do ex-presidente.

“A diminuta e célere fase de registro de candidatura não reabre a revisão integral pela Justiça Eleitoral de decisões tomadas em outras instâncias do Poder Judiciário causadoras de inelegibilidade”, analisou Dodge, em sustentação oral.

Divergência – Com relação à decisão do Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), os ministros entraram em divergência, com o ministro Edson Fachin afirmando que a falta de decreto executivo dando efetividade ao Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos não pode comprometer a sua aplicação em território nacional porque as suas disposições têm efeito supralegal, ou seja, estão hierarquicamente abaixo da Constituição, mas acima da legislação ordinária.  Segundo Fachin, por esse motivo não se pode negar eficácia à medida cautelar expedida pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU.

Durante julgamento, ministro Edson Fachin, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), afirmou que decisão da ONU garante a Lula direito de concorrer nas eleições gerais deste ano. (Foto: Reprodução).

Embora concorde que o ex-presidente Lula deve ser considerado inelegível por força da Lei da Ficha, Fachin entende que, em razão da liminar concedida pelo órgão internacional, o ex-presidente obteve o direito de suspender a eficácia da decisão que resultou na sua inelegibilidade, por isso deve-se reconhecer seu direito de se candidatar às eleições presidenciais enquanto perdurar a medida cautelar deferida.

“A segurança está acima da minha convicção individual e da convicção coletiva. O Poder Judiciário não reescreve a Constituição nem edita as leis. Cumpre as regras e as faz cumprir”, afirmou o ministro.

Fachin acrescentou ainda que não se pode produzir uma regra ad hoc (para a finalidade do caso), por mais “sensível e limítrofe que ele seja”, e ressaltou que a decisão do Comitê da ONU e a prerrogativa prevista no parágrafo 2º do Artigo 5º da Constituição, que dispõe sobre garantias individuais decorrentes dos tratados internacionais do qual o Brasil é parte, garantem a Lula o direito, ainda que em caráter provisório, de se candidatar às eleições deste ano, mesmo estando preso.

Mas prevaleceu a defensa da procuradora, que destacou que a medida cautelar concedida pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU para garantir que o candidato participe das eleições até o trânsito em julgado da decisão, não tem efeito vinculante.

Para ela, a decisão do órgão internacional de monitoramento não gera impacto direto na esfera da Justiça Eleitoral, mas seus fundamentos foram levados em conta, e não acolhidos, sendo que a Lei da Ficha Limpa, que restringe a capacidade eleitoral, é compatível com as obrigações internacionais.

Apesar da decisão dos ministros, o Protocolo Facultativo ao Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, que serviu de base para a medida cautelar da ONU, ainda precisa de promulgação por decreto presidencial, critério exigido para ter aplicação doméstica, de acordo com jurisprudência do STF.

“A Lei da Ficha limpa traz restrições ao direito a ser votado, com fundamentos associados à defesa de direitos humanos, à boa governança e à democracia substancial”, declarou a PGE, ressaltando que estes princípios também defendidos por diversas normas do próprio Conselho de Direitos Humanos da ONU.

“É por essa razão que a lei aplicável a esse caso (Ficha Limpa), ao invés de violar direitos fundamentais, os protege”, afirmou Raquel Dodge.

Campanha – O ministro relator também acolheu a tese defendida pela PGE para afastar a aplicação do artigo da Lei das Eleições que permite a candidato sub judice realizar atos de campanha. Segundo o relator, a jurisprudência da Corte Eleitoral entende que tal condição é superada após decisão do TSE sobre o registro de candidatura.

Para a PGE, a medida é fundamental para impedir que a campanha de candidatos claramente inelegíveis seja financiada com recursos públicos.

“O tratamento a ser dispensado àqueles que, embora manifestamente inelegíveis ou sem reunir todas as condições de elegibilidade de forma induvidosa, resolvam provocar a Justiça Eleitoral, requerendo o seu registro de candidatura, não pode expor nem a higidez das eleições, nem o patrimônio público investido na sua organização e no custeio das campanhas eleitorais”, sustentou, em parecer enviado ao TSE.

Barroso considerou, ainda, não ser necessária a abertura de prazo para alegações finais, visto que a determinação da Lei da Ficha Limpa é clara e não há mais provas a serem produzidas, o que extingue qualquer possibilidade de recurso por parte do ex-presidente.

Sessão de mais de 10 horas de duração, TSE aprovou pedidos de candidaturas de Eymael (DC) e Geraldo Alckmin (PSDB), assim como de seus vices. Haddad também teve candidatura a vice aprovada, o que deve facilitar mudança para candidatura a presidente em nova composição do PT. (Foto: Divulgação).

Outras candidaturas – Na mesma sexta-feira, 31 de agosto, o TSE aprovou os pedidos de registro de candidatura de mais 2 candidatos à presidência e de seus respectivos vices, seguindo entendimento do MPE.

Por unanimidade, o plenário deferiu os registros de José Maria Eymael (DC) e Helvio Costa (DC); e de Geraldo Alckmin (PSDB) e Ana Amélia (PP). A candidatura de Fenando Haddad (PT) para vice também foi aprovada por todos os ministros, o que deve facilitar que ele assuma o lugar de Lula na chapa da coligação entre PT, PCdoB e PROS.

Em relação às contestações feitas à candidatura de Geraldo Alckmin e Ana Amélia, o TSE acolheu a tese defendida pelo MPE e não conheceu os pedidos feitos pela coligação entre MDB e PHS, e pelo candidato à presidência, Henrique Meirelles (MDB), que questionavam o fato de diversos partidos integrantes da coligação de Alckmin não terem mencionado em ata da convenção a concordância em se unir a todas as siglas da chapa.

Para a PGE, os autores do pedido não têm legitimidade para contestar as atas ou decisões tomadas por partidos integrantes de coligações adversárias em razão da autonomia partidária prevista na Constituição.

“O Tribunal Superior Eleitoral tem firme jurisprudência sobre o princípio constitucional da autonomia dos partidos políticos no sentido de que irregularidades sobre convenções partidárias só podem ser questionadas pelos próprios partidos políticos envolvidos, por se tratar de matéria interna corporis”, manifestou.

Segundo Raquel Dodge, contestações externas são admitidas apenas no caso de ocorrência de fraude nas convenções, capazes de interferir no processo eleitoral, o que o TSE entende que não aconteceu.

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