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Candidata a prefeita em Rio das Ostras, Winnie Freitas defende governo construído com diálogo contínuo com a população

Na foto, a candidata a vice, Lívia Torres (à esquerda), e a candidata a prefeita, Winnie Freitas, posam fazendo o número 50 do PSOL com as mãos, em clima descontraído

A jovem de cabelos vermelhos, parte da cabeça raspada e cheia de tatuagens chega com o olhar curioso. A conversa com a candidata à Prefeitura de Rio das Ostras, Winnie Freitas (PSOL), começa nesse clima. É uma mulher empoderada, mãe, servidora pública municipal desde os 19 anos, estudante de Serviço Social pela Universidade Federal Fluminense (UFF), e que não tem medo de dizer o que pensa. Nessa conversa, que começou na praça do centro de Rio das Ostras e terminou num café próximo, ela conta um pouco de como chegou à cidade em que mora há 9 anos, e como se envolveu na política.

Foge dos estereótipos dos políticos de conversa ensaiada e desses clichês que estamos cansados de ouvir quando o assunto é saúde, educação, segurança e todas aquelas promessas que qualquer brasileiro com mais de 10 anos de idade sabe de cor e salteado. Mas não foge da raia. Pelo contrário, sabe bem quem é e o que está fazendo, mas principalmente, sabe que vai enfrentar um problema que assola todas as cidades da região, além do Estado e do governo federal: uma máquina pública inchada e improdutiva naquilo que ela acredita ser sua principal finalidade, que é o serviço público, literalmente falando.

DIÁRIO DA COSTA DO SOL: Como é que você chegou ao PSOL e à decisão de se candidatar? (Essa é a 2ª vez que Winnie se lança candidata a prefeita, tendo conseguido, em 2016, a 4ª posição, com 2.210 votos, ou 4,75% dos votos válidos)

WINNIE FREITAS: Eu sou militante do PSOL desde 2010. Mas não me envolvia muito no início. Até por causa da faculdade, de filho, do trabalho. Comecei a me envolver mesmo em 2015. Não, espera. Em 2014. Eu apoiei 2 candidatos do PSOL a deputado, que não eram daqui da região. Começamos a entender que apesar deles serem ligados aos movimentos sociais, às causas dos direitos humanos, as pautas eram diferentes. Sentimos falta de ter alguém que representasse as causas sociais aqui. Foi quando começamos a pensar em trabalhar com uma candidatura própria. Havia também a questão de apenas 30% das candidaturas serem femininas, e que ainda por cima, não são reais. Queríamos uma candidatura feminina que não fosse fake. Eu não queria ser candidata para servir de laranja para conseguir votos para um homem, que é o que acontece na maioria dos partidos com as candidaturas femininas. Então, em 2015, tivemos essa conversa para eu vir candidata nas eleições de 2016. Uma candidatura que levaria o debate das causas sociais e dos trabalhadores para a população; e para fazer essa denúncia de que, em Rio das Ostras, não existe oposição.

DIÁRIO: Você diz que é contra o loteamento de cargos, que é uma prática comum na nossa política. Como você pretende governar sem o apoio dos vereadores?

WINNIE: Você diz em relação a não ter maioria na Câmara? Não vamos governar com os vereadores e sim com a população. Nosso governo vem de um projeto coletivo. As ideias não são só minhas. Eu sou a voz. Vamos governar com a população junto, através dos conselhos municipais, audiências públicas; nossas pautas estão aqui. (Abre uma pasta e mostra documentos elaborados por alguns conselhos municipais, entre eles o de Cultura). São construções coletivas, e é assim que vamos governar. Por exemplo, os trabalhadores não podem continuar a serem reféns da [Auto Viação] 1001. Precisamos acabar com esse monopólio na nossa cidade. Meu governo vai ser na rua, vamos trabalhar com as reuniões de orçamento participativo, com os conselhos, com plebiscitos, e acredito que assim vamos trazer a população para junto das decisões da Câmara. Os vereadores são representantes dessa população também. Precisamos trazer mais transparência a esse processo, cobrar da Câmara a divulgação da pauta com antecedência, criar uma TV Câmara, tudo isso ajuda. Não dá para eleger um prefeito e esperar que vá resolver tudo sozinho, porque não vai. A gente sabe disso.

DIÁRIO: Falando em resolver sozinho, como um governo de esquerda, que defende as causas da classe trabalhadora, pretende lidar com o problema do inchaço da máquina pública?

WINNIE: Falam muito que eu sou principista. Em relação ter meus princípios e defendê-los. Eu sei que muita gente contratada vai ficar chateada comigo, mas vamos acabar com as contratações da prefeitura. Com todas elas. Depois, vamos criar um grupo de trabalho técnico para fazer um levantamento de todas as necessidades, em termos de funções e cargos; descobrir o que está faltando realmente. Nesse grupo de trabalho vai ter servidores de todos os escalões; na educação, por exemplo, desde diretores até serviços gerais. Precisamos do respaldo de quem está na ponta da lança também. Qual é a demanda? Quando descobrirmos isso, aí vamos fazer provas de progressão dentro das secretarias. Existem hoje, na prefeitura, ADIs (Auxiliar de Desenvolvimento Infantil, cargo de nível médio) com formação superior em pedagogia. Muitos profissionais estão sendo desperdiçados na prefeitura. Em diversas áreas.

DIÁRIO: Como é que se administra com uma folha salarial que muitas vezes chega à metade do orçamento ou mais?

WINNIE: A folha é um problema, mas ela não é o único problema. Precisamos saber qual a necessidade real de profissionais, em todas as áreas. Outra coisa. Não dá para ter um salário de prefeito de 30 mil reais enquanto temos servidores que ganham menos de 1 salário mínimo. Ninguém pode receber menos de 1 salário mínimo. Vamos fazer também uma auditoria dos benefícios e gratificações da prefeitura; saber quem é que recebe, quais são esses benefícios, e por que esses servidores recebem, se merecem, tudo isso. Não sou contra, de maneira nenhuma, mas precisamos saber essas coisas. E precisamos fazer um estudo detalhado dessa folha. Agora, como eu disse, esse não é o único problema da arrecadação.

DIÁRIO: Já que você falou na Educação, vamos começar por ela. Quais são, na sua visão, os principais problemas na área da Educação e quais são as propostas para resolvê-los?

WINNIE: Os problemas são inúmeros. Mas vamos lá. Um dos maiores é o número de vagas, que são insuficientes. Há déficits de vagas em todos os níveis. Outro problema são as salas de aula abarrotadas, com 40, 50 alunos. E com níveis de escolaridade diversos. Eu conheço professora de 2º ano [do Ensino Fundamental, antiga 1ª série], que tem uma turma com mais de 20 alunos, sendo que tem desde alunos que não sabem letra nenhuma até alunos que já sabem ler e escrever. Como é que se dá aula para uma turma assim? Não tem como. Precisamos melhorar as condições de trabalho dos profissionais da Educação em todos os sentidos. Parece utopia, mas eu quero escolas com áreas verdes em que as crianças possam estudar ciências dentro da escola. Estudar música, dança, teatro. Precisamos do ensino da cultura nas escolas. E se não há escolas que possam abrigar essas atividades, que se construam outras escolas ou se reative os Centros Integrados de Convivência (CICs), que foram fechados.

As chamadas "escolas de lata", com uso contêineres, adotadas pelos 2 últimos governos de Rio das Ostras, foram criticadas pela candidata a prefeita pelo PSOL. (Foto: Reprodução).

DIÁRIO: Mas como construir novas escolas com todas as dificuldades orçamentárias e o inchaço da máquina?

WINNIE: Eu não sou contra isenção fiscal. Mas elas precisam ser dadas como contrapartida de algum serviço que retorne para a população. Os contratos da ZEN (Zona Especial de Negócios), por exemplo, todos eles têm isenções fiscais. Mas o que essas empresas estão dando de retorno para a população? A folha é um problema, mas ela não é o único, porque arrecadação é uma questão de prioridades. Por que aumentar o IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) de toda a cidade em 100%? Vamos aumentar das empresas. Elas podem pagar. Não pode aumentar em 100% o IPTU do morador que você entra na casa dele com o pé direito e quando dá um passo com o esquerdo, saiu da casa. Vamos criar parcerias com essas empresas, chamar as que estão em dívida com o município, por exemplo, e convidá-las a pagar a dívida com a prestação de serviços para a população. Uma construtora tem dívida? Bota para construir uma escola.

DIÁRIO: E para a segurança pública?

WINNIE: Precisamos oferecer melhores condições de trabalho para os setores da segurança também. E para isso, pressionar o governo estadual [por investimentos].

Escuridão que se alastra por diversas ruas da cidade, inclusive no centro, foi um dos problemas lembrados por Winnie ao falar da violência e do alto número de estupros na cidade. (Foto: Reprodução).

DIÁRIO: Mas como se pressiona um governo quebrado?

WINNIE: É aquela questão das prioridades. O governo nem sempre esteve em crise. E sabe qual foi o investimento em inteligência das polícias nos últimos anos? Zero. Guarda Municipal não é polícia. Não podemos colocar esses profissionais em risco. Segurança é uma questão bem mais ampla. Não é proibindo os estabelecimentos de funcionar depois das 22h que vai se resolver o problema da segurança. Até piora, porque com tudo fechado, as ruas ficam desertas. Precisamos garantir um transporte público de qualidade também no horário noturno, para que a população possa ter condição de sair e de chegar a qualquer horário. A iluminação também é importante. A cidade hoje está às escuras. A gente sabe que a iluminação não vai resolver os problemas da segurança, mas ajuda a inibir. Precisamos discutir essas questões em audiências públicas. Segurança não se resolve com polícia, e sim com educação, cultura. Hoje a juventude não tem acesso a outras opções de vida além do tráfico. Aí entra a escola, a educação e a cultura como instrumentos de formação desses jovens, de fazê-los entender e questionar a sociedade, oferecer mais acesso a outras possibilidades.

DIÁRIO: Quando a gente fala em outras possibilidades, logo vem a questão da geração de empregos. Quais são as suas propostas para resolver esse problema da cidade? E principalmente, é possível fazer com que a mão de obra de Rio das Ostras pare de depender do petróleo e de Macaé?

WINNIE: É possível sim. Mas não é fácil. Entre 2015 e 2016, perdemos 17 mil postos de trabalho em 2 anos. Nos últimos 26 anos, ninguém se preocupou em utilizar os royalties para diversificar a economia, para não depender mais do petróleo. Rio das Ostras é uma cidade linda. E a gente não tem turismo. Temos um festival de jazz (Rio das Ostras Jazz & Blues Festival), mas não temos jazz nas escolas. É um festival elitizado para quem vem de fora, não é para a cidade. E deveria ser.

DIÁRIO: Realmente, Rio das Ostras poderia ser uma Nova Orleans brasileira pelo tempo que abriga esse festival...

WINNIE: Ter jazz nas praças, nas escolas, sim. Investir em outros festivais. A cidade já teve festivais de teatro, de dança. Onde estão esses festivais? Cultura também gera emprego. Precisamos retomar essas atividades e ampliá-las. Fazer um festival de jazz que entre no Âncora, na Cidade Praiana, no Mar do Norte, que ocupe a cidade toda. Não é questão de levar cultura para essas comunidades. Mas de aumentar o acesso. Criar programas para fomentar as atividades culturais próprias dessas comunidades também. Reconhecer a cultura que se produz nessas localidades, na cidade toda. Isso também gera emprego.

Enquanto em Rio das Ostras (à esquerda), festival de jazz acontece em locais mais "elitizados", em Nova Orleans (à direita), no EUA, cidade berço do jazz, apresentações acontecem nas ruas, em diversas partes da cidade. (Fotos: Divulgação/Reprodução).

DIÁRIO: E para a Saúde, quais são as propostas?

WINNIE: A primeira coisa é investir numa saúde preventiva. Ampliar a Estratégia de Saúde da Família (ESF). Os Postos de Saúde do Marileia e do Âncora estão sobrecarregados. São bairros enormes, que precisam de mais unidades de saúde. Mas não é só aumentar o número de unidades. Precisamos também aumentar o número de especialidades dentro dessas unidades, para que a população não precise se deslocar para ter atendimentos básicos de saúde. Melhorar a garantia dos insumos também é importante. Não adianta eu ter um especialista numa unidade que não tem nem luva para trabalhar. Isso não é só investimento para a população, é investimento no servidor também. Hoje não tem. Não vamos resolver tudo da noite para o dia, mas podemos buscar parcerias intermunicipais, por exemplo. Se eu tenho uma especialidade aqui que não tem em Macaé, e eles têm outra que aqui não tem, podemos fazer uma parceria. Pelo menos até que consigamos ampliar de verdade a oferta desses serviços. E isso sem esquecer a Emergência. Temos que ampliar o Pronto Socorro e melhorar o Hospital Municipal, e investir também em unidades de saúde da mulher, do idoso, da criança. Saúde da mulher não é oferecer ginecologista. É muito mais. Assim como atender o idoso e a criança. Nós temos um campus da UFF aqui, um curso de enfermagem, um curso de serviço social, um curso de psicologia. Por que não se investe em parcerias na área de pesquisa médica em projetos de extensão?

DIÁRIO: E com relação ao transporte público?

WINNIE: Temos muitos problemas nessa área na nossa cidade. A primeira coisa é entender que transporte público não é mercadoria, então a empresa não pode visar somente o lucro. Precisamos de cooperativas reais, não essas que são de fachada. Precisamos de cooperativas de transporte que atendam à população. Precisamos de uma empresa pública de transporte. Mas não é só isso. Transporte também se resolve com urbanização, calçamento das ruas, planejamento de tráfego. Não adianta sair colocando asfalto em tudo que é canto sem fazer um planejamento, sem colocar rede de esgoto, de abastecimento de água. Precisamos de um Terminal Rodoviário de verdade, porque aquele ali não é um terminal. E a gente já tem uma ideia de local para ele, na Estrada do Contorno, com integração de lá para o centro da cidade. Precisamos estudar uma forma de transporte público que rode dentro dos bairros. Rio das Ostras precisa investir para que as pessoas parem de andar de carro. Não dá mais. A cidade está saturada. Investir em transporte alternativo, com bicicletários públicos, com ciclovias que funcionem de verdade, e investir na malha ferroviária, pelo menos para o transporte de carga.

Winnie Freitas também falou sobre necessidade de se buscar soluções para os problemas causados pelo avanço do mar nas praias da Tartaruga e do Abricó, que estão sendo destruídas. (Foto: Reprodução).

DIÁRIO: Você falou do saneamento. Não poderia deixar de ouvir suas propostas para essa área, que é um dos grandes problemas da cidade e da região.

WINNIE: Essa é uma das nossas prioridades. Resolver essa questão. A cidade não pode mais ficar sem esgoto e água tratada. Não pode. Vamos verificar a situação dessa parceria do saneamento [PPP do Esgoto] para saber por que não está funcionando. Onde estão os resultados? Precisamos cobrar que funcione. Se a cidade pagou, tem que resolver. E se não pagou, vamos dialogar com a empresa (BRK Ambiental, que substituiu, pelo menos, nominalmente, a Odebrecht Ambiental) para resolver. A cidade não pode ficar sem esses serviços mais. Agora, infraestrutura não é só água e esgoto, é ter uma cidade melhor urbanizada, mais arborizada. Olha a praça, não tem uma sombra nela. E isso acontece em boa parte da ciclovia também. Não tem árvores. Existe o problema do avanço do mar nas praias da Tartaruga e do Abricó também. Sabemos que não é uma obra barata, mas daqui a pouco, vamos perder tudo ali. Além de outras coisas que a cidade precisa, como investimentos em drenagem pluvial e escoamento de água para os problemas de alagamento com as chuvas.

DIÁRIO: Há ainda alguma coisa que a gente não comentou que você queira acrescentar?

WINNIE: Na verdade, eu não sei se eu falei antes, mas eu sou mulher, socialista e feminista, mas esse não é o projeto de governo exclusivo da Winnie. Eu nem quero fazer isso para o resto da vida. Eu sou assistente social, essa é minha profissão. É isso que eu quero fazer; quero poder cuidar da minha filha. Hoje estou aqui como o rosto, a voz e a imagem de um projeto político que me escolheu para estar aqui, mas o governo não será da Winnie. Essas são as nossas propostas, mas se a população não quiser, por exemplo, uma empresa pública de transporte, quiser outra coisa, vamos dialogar e encontrar outras opções. Nosso governo será junto com a população. Quanto ao servidor público, nós vamos investir na valorização, em melhorar as condições de trabalho, mas sempre tendo em vista que a principal finalidade é o serviço público, é atender a população.

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